Quem foi Johanna Dobereiner e porque sua descoberta revolucionou a agricultura?

Quem foi Johanna Döbereiner? E porque  sua incrível descoberta revolucionou a agricultura primeiro  no brasil e mais tarde no mundo? 

Mulher, pesquisadora e dona de uma mente brilhante. Johanna Dobereiner já demonstrava seu potencial desde o início de sua graduação, embora o seu reconhecimento no meio acadêmico tenha chegado à flor da idade aos 72 anos de idade. Uma cientista, sem dúvidas, à frente do seu tempo! Tempo em que pregava-se pela adubação química como o caminho da ascensão da produção agrícola. Sem contar as críticas ferrenhas a sua pesquisa, pois o ambiente acadêmico de sua época era considerado hostil, tornando a sua pesquisa e de muitas outras pesquisadoras mulheres ainda mais difícil. 

Mas… partindo para o seu trabalho, vamos falar um pouco mais de microbiologia? Ou seja, da ciências que estuda microrganismos como as bactérias? 

De maneira simplificada, ocorre na natureza um processo em que as bactérias presentes no solo, mais especificamente em nódulos das raízes de plantas leguminosas (bactérias fixadoras),  fixam o nitrogênio (N2) – um gás atmosférico presente no ar. 

Após essa fixação, o gás nitrogênio fica preso nos nódulos das raízes das plantas leguminosas e acaba se transformando em amônia (NH3). No entanto, a amônia é um composto tóxico para grande parte das plantas e por isso, deve ser transformada. Sendo assim, esta virá nitrato a partir da ação de bactérias do tipo nitrificantes, a parti do processo de nitração. A nitração é dividida em duas etapas: Na primeira ocorre a transformação de amônia em nitrito (NO2-) e secundariamente de nitrito em nitrato (NO3-). O nitrato é um composto não tóxico para as plantas e é fundamental para o crescimento destas! Ele é considerado a molécula química que as células das plantas assimilam de fato. 

Existe outro processo, também realizado por bactérias (bactérias desnitrificantes) conhecido como desnitrificação, que trata da transformação do nitrato em nitrogênio (N2) que volta para a atmosfera.  Todo esse processo descrito é conhecido como Ciclo de Nitrogênio! (Figura 01- Ciclo de Nitrogênio). 

Então da mesma forma que as plantas assimilam o nitrogênio, também devolvem para a atmosfera de forma cíclica. 

E Johanna foi justamente a pesquisadora que descobriu o processo de fixação do nitrogênio presente no ar, realizado pela ação de bactérias, que auxilia no crescimento das plantas leguminosas.  Em outras palavras a pesquisadora observou um evento natural que não mais precisaria de adubação química para que as plantas crescessem, o que economizou milhões de dólares na agricultura e tornou a produção da soja, por exemplo, muito menos agressiva ao meio ambiente. Para se ter ideia, o Brasil deixou de utilizar adubo mineral, que é caro e prejudicial ao ambiente, e hoje economiza em torno de 1 bilhão de dólares anualmente, segundo a Revista FAPESP. 

De fato, a descoberta da pesquisadora foi um marco muito importante na ciência! Tão importante que seu nome é bastante conhecido no ambiente acadêmico, contudo, fora desses muros se conhece muito pouco sobre essa grande pesquisadora. Para se ter noção, Johanna chegou a ser indicada ao Nobel de Química, passou a se tornar assunto de revistas nacionais importantes e recebeu diversos prêmios e homenagens. 

 Fonte: Ciclo do Nitrogênio assimilado pelas plantas. Beduka, 2020. 

Mas calma, se a fixação ocorre naturalmente, o que potencializou o crescimento das plantas leguminosas como a soja? 

Johanna insistia justamente na introdução de algumas bactérias no solo para que o crescimento se desse mais rápido. Ao todo ela descobriu 9 espécies de bactérias fixadoras de nitrogênio (N2). Essas bactérias se associavam a gramíneas, cereais e tuberosas (raízes). Existe uma relação mutualística entre plantas e bactérias! Mas você deve estar se perguntando o que é e como acontece esse tipo de relação: 

Para exemplificar, existe um gênero de bactérias conhecidas como  Rhizobium, essas bactérias funcionam como adubo para o solo e dão para as plantas sais de nitrogênio essenciais para o desenvolvimento destas. As plantas, por sua vez, dão a essas bactérias matéria orgânica,  fundamental para a seus processos vitais.  Ou seja, na prática, uma relação mutualística é justamente uma relação que trás benefícios mútuos para ambos os seres vivos que participam de um dado processo. 

Johanna descreveu, em 1974, um episódio em que aconteceu a associação de bactérias fixadoras de N2, do gênero Azospirillum, com Gramíneas da espécie Paspalum notatum, Tempos depois, descobriu que bactérias do mesmo gênero também estavam associadas a milho de forrageiras e mais tarde descobriu que bactérias fixadoras de N2 Gluconacetobacter diazotrophicus estavam associadas a Cana de açúcar. 

Mas não se engane, Johanna não nasceu no Brasil, sua trajetória começa muito antes… Em 1945 na Tchecoslováquia – hoje República Tcheca, a futura pesquisadora até, junto de seus parentes, inclusive seu pai, então professor de físico-química na Universidade de Praga, tiveram de fugir para a região da Alemanha oriental por conta de perseguições aos alemães que ocorria na região da Tchecoslováquia. Foi aí então que Johanna começou a trabalhar como camponesa na fazenda de seus avós, e por lá começou a utilizar esterco para realização da adubação do solo. Contudo, anos depois, ocorreu a morte de seus avós e Johanna teve de voltar à Alemanha oriental, onde continuou trabalhando no campo. Mas adiante, uma então paixão pelas plantas acabou levando Johanna a se matricular no curso de agronomia da Universidade de Munique, onde se formou em 1950. 

Contudo, na década de 50, um momento extremamente conturbado, de polaridade dado pela Guerra Fria, a pesquisadora e os que restaram de sua família de alemães, se refugiaram no Brasil para fugir da situação catastrófica da Alemanha pós guerra. Mas, nem tudo estaria perdido… 

Johanna acabou se apaixonando pelo Brasil e principalmente por todas suas riquezas naturais, exuberância de fauna e flora e tudo que há de mais bonito como bem conhecemos. E assim que chegou, teve a oportunidade de trabalhar no Departamento de Microbiologia do antigo Instituto de Ecologia e Experimentação Agrícola, que hoje em dia é o atual Centro Nacional de Pesquisa em Agrobiologia da Embrapa no município de Seropédica, Rio de Janeiro. A pesquisadora iniciou como voluntária, pois não era especializada ainda em microbiologia, mas por ironia do destino a sua incrível descoberta estaria justamente na área de microbiologia do solo.

E conforme o tempo foi passando a pesquisadora se naturalizou brasileira e por esses solos, ficou até sua morte. Johanna era encantada pelo Brasil, e desde o início já afirmava:“ há neste solo brasileiro algo de especial, pois olhem só o verde exuberante desta vegetação e destes gramados!”.  

De fato, sua trajetória foi encantadora, não é atoa que até hoje a cientista é lembrada com muito carinho e admiração. Que a história de Johanna possa motivar muitas mulheres a fazer ciências e se interessar  pela área. 

Você já pensou quantas vidas Johanna salvou da fome? Porque Norman Borlaug recebeu o Nobel e ela não?

Referências Bibliográficas: 

Antonio, M. C.  ‘’O legado de Johanna Döbereiner: uma contribuição decisiva para a agropecuária brasileira’’. Disponível em: https://revistapesquisa.fapesp.br/o-legado-de-johanna-dobereiner/.  Acesso em: 21/03/2021. 

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). ‘’Johanna  Döbereiner: a cientista que revolucionou a agricultura’’. Disponível em: https://www.embrapa.br/johanna-dobereiner/quem-foi.  Acesso em: 21/03/2021. 

Nussenzveig, P. ‘’Pesquisas de Johanna Döbereiner revolucionaram a agricultura no Brasil: estudo sobre a ação de bactérias para fixar nitrogênio nas plantas permitiu evitar o uso de fertilizantes poluentes’’. Disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/pesquisas-de-johanna-dobereiner-revolucionaram-a-agricultura-no-brasil/. Acesso em: 21/03/2021. 

Agner R. de Souza. ‘’Johanna Döbereiner: a presença feminina que revolucionou a agricultura’’. Disponível em: https://proec.ufabc.edu.br/gec/profissao-cientista/johanna-dobereiner/. Acesso em: 21/03/2021. 

Ghiovana Freire

Ghiovana é graduanda do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Rio do Janeiro (UFRJ) no instituto NUPEM. Atualmente é membro do Projeto de Extensão ProREC. Apaixonada por plantas, ela pretende focar sua carreira em pesquisas relacionados ao meio ambiente, fisiologia vegetal e divulgação científica no combate a Fake News.

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