Saneamento básico no Bra$il: Uma realidade vergonhosa

Quando eu era criança e ia à praia, observava toda aquela natureza exuberante do mar em contraste com a vista da cidade, mas o que mais me incomodava eram os canos de despejo e o cheiro que emanava. Eu me perguntava: “- Será que eu vou ficar doente se nadar nessa água?” Eu não tinha o mínimo entendimento sobre o tema e essa insegurança me incomodava, não entendia muito bem o cenário atual do Brasil a respeito do saneamento. Uma pesquisa rápida pelo tema me conduziu a uma triste constatação, assim como em vários municípios costeiros, o cenário no Brasil inteiro, com relação ao tratamento de água e esgoto, é muitas vezes ineficaz ou inexistente. Como já faz um tempo que eu ando pensando nesse assunto, decidi trazer alguns dados e informações para vocês nesse texto.  

De acordo com a constituição  Federal de 1988, é dever do Estado promover o saneamento básico para todos os brasileiros, porém a realidade é bem diferente. Apenas 54,1% dos brasileiros possuem o serviço de coleta de esgoto e apenas 49,1% dos esgotos de todo os país é tratado (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS 2019). Isso se deve principalmente por conta de alguns fatores, entre eles estão a falta de investimentos e o desenvolvimento de projetos de baixa qualidade.

Sobre a falta de investimentos, é importante dizer que, mesmo sobrando recursos, o Brasil investe anualmente menos do que o necessário em saneamento básico. De acordo com o CNI (Confederação Nacional da Indústria), entre 2009 e 2014, a média investida foi de 9,4 bilhões de reais. Você pode estar pensando : “ Nossa João, mas isso é muito”, mas eu te respondo meu caro leitor, o valor necessário para esse investimento seria de 15,2 bilhões por ano e sim, há recursos disponíveis. Infelizmente isso ocorre ao longo dos anos, os valores investidos em saneamento básico são inferiores a 80% do total de dinheiro disponível. 

Esses recursos, muitas vezes, não são totalmente utilizados por conta da burocracia. Ainda de acordo com o CNI, a média de tempo que leva entre o início dos trâmites e a liberação da verba é de 27 meses. Então, quando esse dinheiro chega para a obra, a cidade já sofreu muitas mudanças.

Muitos dos projetos não levam em consideração o crescimento populacional da cidade, as suas características sociais, culturais, econômicas e ambientais. Por conta disso, alguns “imprevistos” (que poderiam ser previstos) acontecem e o custo da obra acaba se tornando maior e portanto vários projetos acabam paralisados. Abaixo vocês podem ver um gráfico produzido pela BBC News Brasil que mostra a quantidade de obras paradas nos setores de habitação, infraestrutura e saneamento básico. 

Fonte : BBC News Brasil, 2019 .

Como podemos ver, mais da metade das obras paradas financiadas com o dinheiro do FGTS são obras voltadas para o saneamento. Ou seja, nós estamos pagando por um serviço que não está sendo prestado. Porém, ainda temos outro problema a respeito do assunto : os malefícios que a falta de saneamento básico traz para a nossa saúde e para a natureza.

Com a falta de saneamento básico, vários rios e oceanos são poluídos diariamente. Nas regiões periféricas urbanas e rurais, com a falta das estruturas de distribuição de água e coleta de esgoto, muitos moradores não possuem opção senão o descarte irregular, que na maioria das vezes é despejado diretamente em corpos d’água, valas a céu aberto, e principalmente, em fossas rudimentares*. Porém, em muitos bairros ricos, obras clandestinas são realizadas e o esgoto não é devidamente descartado, provocando a poluição dos rios que passam pela cidade. De acordo com o Ranking do Saneamento, do instituto trata Brasil, apenas em 2017 o Brasil despejou cerca de 5.622 piscinas olímpicas de esgoto não tratado no meio ambiente. Esse esgoto vai direto para o oceano, levando plástico e outros materiais orgânicos e inorgânicos, provocando doenças e mortes. De acordo com alguns dados obtidos pelo Painel Saneamento Brasil, apenas em 2018, aproximadamente 233 mil casos de doenças são relacionados à falta de saneamento, provocando 2180 mortes.

Garantido pela constituição de 1988, o saneamento básico é direito de todo brasileiro. Infelizmente, abrindo os olhos para a nossa realidade onde 49% da população brasileira não possui acesso a saneamento básico, percebemos que este direito pouco saiu do papel. Não investir em tratamento e saneamento de esgotos é ficar parado no tempo,visto que grandes cidades antigas (como Roma), já possuíam sistemas que levavam  os dejetos para fora da cidade.  

No Brasil, a estrutura insuficiente de saneamento básico, principalmente causada por baixo investimento e projetos ruins, como o investimento em fossas rudimentares, as quais representam 53,17% do destino do esgoto doméstico de todo o Brasil, aumentam a incidência de doenças como a esquistossomose, leptospirose e dengue. Para que essa realidade mude, precisamos buscar nossos direitos, afinal como nosso país pode crescer sem o básico? 

* Fossas rudimentares: erroneamente conhecidas como fossas negras são sistemas de acúmulo de esgoto doméstico em fossas (buracos no chão) em contato direto com o solo.


Referências: 

CAMILLA VERAS MOTA (São Paulo). BBC News Brasil. Por que quase metade do Brasil não tem acesso a rede de esgoto. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-49399768. Acesso em: 12 maio 2021.

INSTITUTO TRATA BRASIL. 5 aspectos para entender o Saneamento Básico! 2018. Disponível em: http://www.tratabrasil.org.br/blog/2018/04/12/aspectos-precisa-saber-saneamento/. Acesso em: 12 maio 2021

INSTITUTO TRATA BRASIL. Conheça algumas doenças causadas pela falta de saneamento básico. Tratabrasil.org.br. Disponível em: <http://www.tratabrasil.org.br/blog/2018/02/27/doencas-falta-de-saneamento-basico/>. Acesso em: 12 May 2021.

INSTITUTO TRATA BRASIL. Dia mundial da saúde: Como a falta de saneamento afeta a saúde da população? -. Tratabrasil.org.br. Disponível em: <http://www.tratabrasil.org.br/blog/2020/04/07/dia-mundial-da-saude-como-a-falta-de-saneamento-afeta-a-saude-da-populacao/>. Acesso em: 12 May 2021.

‌INSTITUTO TRATA BRASIL. Documentário com os Embaixadores do Trata Brasil – A realidade do Saneamento Básico no país. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=69N9aYM9bco&ab_channel=InstitutoTrataBrasil>. Acesso em: 12 May 2021.

João Marcello Oliveira Galeno

Amante de plantas e curioso nato, João Marcello Oliveira Galeno é estudante de Graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) no Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade (NUPEM). Auxiliar de professor com experiência em recursos audiovisuais e formado como técnico de enfermagem.

4 comentários em “Saneamento básico no Bra$il: Uma realidade vergonhosa

  • 26 de agosto de 2021 em 22:02
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    Parabéns pelas informações bem claras.
    Infelizmente essa é a realidade do nosso Brasil.
    Precisamos estar por dentro dos acontecimentos e saber os nossos direitos.

  • 26 de agosto de 2021 em 22:23
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    Muito bom o texto, muito esclarecedor!
    E me faz refletir no que temos feito e no quanto temos cobrado dos órgãos competentes!

  • 26 de agosto de 2021 em 22:29
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    Parabéns pela iniciativa. Esse artigo é bem interessante.

  • 26 de agosto de 2021 em 23:08
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    É um orgulho saber que temos representantes como você, que pensa no outro, no futuro que mesmo que não esteja mais aqui, fica a existência de um planeta lindo que temos e muitos não dão valor. Se cada um fizer a sua parte, as coisas mudariam, mas, infelizmente nem todos pensam assim. Fica meu apoio e parceria em uma educação que acreditamos um dia viver numa realidade melhor

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