Álcool em gel e nada é a mesma coisa: Reconhecendo uma fake news

Por Gabriela Bessa e Wagner Araujo


Bom, a gente vai falar de um assunto que tem sido bastante comentado em todos os meios de comunicação de um tempo pra cá, e tem nos feito questionar se as informações que chegam até nós são reais. Estou falando das fake news. Todos nós estamos sujeitos a propagá-las, mas você já parou para pensar em como elas são estruturadas e como podemos fazer para evitar cair nelas? 

Agora seja sincero, o título desse texto te chamou atenção? Provavelmente sim…

A pandemia da Covid-19 reforçou o quanto somos vulneráveis às fake news. Diante da grande quantidade de informações em circulação, alguns pesquisadores chegaram a chamar esse momento de infodemia, ou seja, além da pandemia em si, estamos vivenciando também, uma epidemia de informação. Acontece que boa parte dessas informações não trazem qualquer contribuição para o combate à Covid-19, produzindo confusões e orientando a adoção de práticas equivocadas. Por exemplo, em fevereiro de 2020 começou a circular nas redes um vídeo de um homem que se autointitulou “químico autodidata” e nele, afirmava que o álcool em gel não possuía propriedades antissépticas e deveria ser substituído pelo vinagre. Sua fala contrariava todas as recomendações das autoridades sanitárias e da Organização Mundial de Saúde, colocando em risco a saúde da população que ansiava por novas notícias para o combate do até então vírus desconhecido. 

Mas o que é uma fake News? Fake news é o nome dado a propagação de informações que não são verdadeiras, que podem interferir de forma negativa em diversos aspectos sociais, como saúde, política e segurança. Isso é um problema que antecede as redes sociais e ousamos dizer que está presente desde a história da humanidade. 

Quem nunca recebeu informações duvidosas pelo whatsapp ou outras redes sociais?

Com o avanço da tecnologia e o uso de meios digitais, a velocidade de propagação de notícias aumentou significativamente. Diariamente somos bombardeados por informações, que devem ser analisadas com calma, para que não sejamos nós os próximos a propagar essa corrente. Só para se ter uma noção, de acordo com a matéria publicada na revista Forbes, só nos últimos dois anos o volume de dados criado por nós é maior do que a quantidade produzida em toda a história da humanidade. Segundo um estudo da Universidade da Califórnia, em apenas uma edição semanal do jornal impresso The New York Times há mais informação do que um homem inglês do século 17 poderia consumir durante toda a sua vida.  De acordo com site Omni Calculator, se você a cada hora do seu dia gastar 5 minutos nas redes sociais (como facebook ou instagram), em um ano o tempo gasto seria o mesmo necessário para você ler 61 livros. Sim, 61 livros de 240 páginas em média!!!  Com tanta informação disponível, pode ser difícil conseguir saber que informação é confiável e qual não é. Agora pense o quanto pode ser arriscado se essa confusão envolver a sua saúde!

Muitas vezes as fake news se utilizam de recursos específicos, alguns destes podem ser vistos no exemplo do vídeo do sobre o álcool em gel  citado anteriormente. No vídeo, o homem utiliza um discurso de autoridade, aparentando bastante segurança em suas falas, passando assim, maior confiabilidade ao ouvinte, principalmente por demonstrar experiência, ao se intitular como  “químico autodidata desde 1995”. Autodidata, é alguém que aprende determinado conteúdo sozinho, sem a ajuda de ninguém e sem formação acadêmica. A química, em especial, é uma área que envolve muitos anos de estudos em um curso superior, com todas as aulas teóricas, experimentos, levantamento de dados científicos, estágios, debates, visitas laboratoriais, entre outros. Dessa forma, ser um “químico autodidata”, pode ter como consequência, um conhecimento sem validação científica, acarretando em disseminação de notícias falsas ou ainda não comprovadas.

Outros recursos analisados, são a utilização de palavras rebuscadas e termos técnicos e científicos, para passar uma falsa ideia de que a informação é fundamentada cientificamente e que o apresentador do vídeo tem um maior domínio sobre o assunto.  Essa estratégia tem a finalidade de reforçar o argumento de autoridade e aumentar a confiança no discurso apresentado no vídeo. Por exemplo, o apresentador utiliza termos como: “hidroxietilcelulose” e “carboximetilcelulose de sódio” , que são componentes derivados da celulose. O “químico autodidata” também apresenta as suas falas como  “verdades absolutas”, afirmando que “todo químico que diz o contrário, está errado”. Além disso, ele faz  uso de teorias de conspiração ao afirmar que a campanha pela venda do álcool em gel é apenas o lucro e não sua eficácia. Para isso, ele faz conexões com teorias da conspiração já existentes, o que chama a atenção do público (por exemplo, aquelas relacionadas à Rede Globo de TV). Ainda, é comum encontrar nesse tipo de mídias usadas para disseminar fake news uma polarização de posições ideológicas e discursos de ódio, visando menosprezar grupos e pessoas contrárias às suas ideias, entre outros.

Você já ouviu falar na “pílula do cancêr”? Já fez uso de receitas imediatas de emagrecimento divulgadas pela internet? Ou ainda, alimentos milagrosos que curam diversas doenças? E as recentes notícias falsas de que uma vacina contra o novo coronavírus seria capaz de alterar nosso DNA?

Diversos pesquisadores buscam estudar com mais profundidade a relação do nosso cérebro com as fake news, mas já sabemos que ao receber notícias satisfatórias para nós ou que gostaríamos que fossem verdadeiras, os mecanismos de recompensa imediata do cérebro são estimulados, proporcionando uma sensação de prazer momentânea, semelhante até ao uso de drogas. Essa euforia pode limitar o desenvolvimento de uma percepção crítica e fazer com que repassemos as informações sem ao menos checar se são verdadeiras. Veja alguns exemplos disso nas imagens destas manchetes:

Quem não gostaria de comer, sem culpa, sorvete no café da manhã? Por isso, mesmo sendo uma pessoa atenta e entendida sobre os assuntos, você pode ser manipulada a acreditar em fake news que estejam de acordo com as suas crenças ou lhe tragam alguma satisfação emocional. Confessamos que reconhecer uma notícia como falsa, nem sempre é uma tarefa fácil. Afinal, como vimos, elas são articuladas para o convencimento. É possível, facilmente, ganhar algum debate sem necessariamente ter conhecimento sobre o assunto, apenas trabalhando para desestabilizar emocionalmente o oponente.  

Portanto, antes de repassar qualquer informação, listamos cinco dicas para evitar que você caia em mais uma pegadinha:

  1. Analise a data da postagem para ver se condiz com o momento atual.
  2. Analise o autor e procure saber um pouco mais sobre ele.  Duvide de notícias sem fonte!
  3. Leia além do título, com calma!  Não deixe que sua identificação com o conteúdo sobressaia.
  4. Verifique se a notícia apareceu em diferentes fontes.
  5. Na dúvida, não compartilhe!

E aí, qual foi a última fake news que recebeu e como você a reconheceu? 

Compartilhe sua experiência com a gente e lembrem-se: CONFIE NA CIÊNCIA!

Outros links Interessantes:
– O que os estudos dizem sobre eficácia do álcool em gel e por que 70%?
https://www2.ufjf.br/noticias/wp-content/uploads/sites/2/2020/04/nota-tecnica-gte-antissepticos-regina.pdf
– Desfazendo fake news relacionadas à covid-19 –
https://www.bbc.com/portuguese/geral-55013716 http://informe.ensp.fiocruz.br/noticias/48548

Referências:
Richard S Wurman . INFORMATION ANXIETY 2, Pearson Education (US), EUA. 2001


Américo Pastor

Professor Adjunto do Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Realizou estágio pós-doutoral em Ensino de Saúde (EEAAC-UFF) e Cognição Social (UCP). Possui doutorado e mestrado em Educação em Ciências e Saúde pelo Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde (NUTES-UFRJ), bacharelado em Psicologia pela Universidade Católica de Petrópolis e bacharelado em Desenho Industrial (Design - Programação Visual) (UFRJ). Desenvolve pesquisas sobre aprendizagens mediadas por tecnologias, linguagens e audiovisuais nos espaços formais e não formais de educação em ciências e saúde.

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